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Parasita

Por Luiz Fernando Gallego

Quem parasita quem? 

A família sul-coreana Kim é pobre e mora num cafofo ao rés do chão de um beco, praticamente abaixo do nível da rua. Pai, mãe, filho e filha sobrevivem dando “jeitinho” em tudo, desde como acessar o wi-fi do apartamento de cima até pleitear vagas de trabalho como profissionais experientes (que não são). Vivem de expedientes mais ou menos amorais, sem consideração por quem compete com eles pelos mesmos postos, precisando trabalhar: afinal, como diz a mãe desta família, é “gente rica que pode ser gentil”.

A família Park é rica e, de modo geral, gentil. Especialmente a educada Senhora Park. Eles moram numa bela casa construída por arquiteto famoso e nem sabem que existe um bunker subterrâneo em sua ampla moradia (no caso de a Coreia do Norte jogar bombas sobre a do Sul). Também não percebem que os novos empregados e prestadores de serviços que vão contratando aos poucos sejam membros da mesma família do parágrafo acima. 

O parágrafo sobre os Kim ficou mais acima, mas eles estão bem abaixo em termos de escala socioeconômica. A conhecida metáfora verbal sobre quem está “por cima” e quem está “por baixo” é ilustrada visualmente ao longo do filme: por exemplo, vemos enormes escadarias que unem (ou seria melhor dizer “separam”) os bairros ricos da cidade alta dos bairros que ficam lá embaixo, na periferia, verdadeiras favelas que podem sofrer com temporais o mesmo que  acontece nas favelas cariocas.

Um inteligente tom de farsa perpassa todo o filme, de modo até mesmo cômico na primeira metade do enredo, que deixa bem explicitado que nem os pobres são integralmente bonzinhos, nem os ricos são obrigatoriamente mauzinhos, embora estes tenham mais sensibilidade olfativa, uma premissa importante para acontecimentos posteriores do enredo. Mas maniqueísmo não é um defeito deste roteiro, embora seja frequente em tantos filmes (como em alguns brasileiros).  

O uso da linguagem farsesca situa os pobres da família Kim como espertos e algo maliciosos; já a senhora Park surge como bastante ingênua, uma característica necessária para que contrate os falsos professores da família Kim sem desconfiança. 

Falamos antes da arquitetura da casa dos ricos, e também cabe usar o termo “arquitetura” para o roteiro construído habilmente, sem discurso proselitista na abordagem de temas espinhosos na esfera social, usando de ironia, até mesmo sarcasmo, chegando ao humor negro – quando já se configura um drama com toques trágicos: afinal, a disparidade econômica é uma tragédia mundial.
 

Parasita (Gisaengchung), de Bong Joon Ho (Coreia do Sul, 2019). Com Kang-ho Song, Sun-kyun Lee,

Yeo-jeong Jo.

Comédia dramática. Sinopse: Uma obra do acaso faz com que o filho adolescente de uma família pobre comece a dar aulas de inglês a uma garota de família rica. Diante da vida luxuosa dessas pessoas, pai, mãe, filho e filha bolam um plano para se infiltrar na família burguesa, um a um. 132 min. 14 anos.

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