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Bom Dia, Noite (Buongiorno, notte), de Marco Bellochio (Itália)

Por Carlos Augusto Brandão

Conhecido por filmes controversos como "De Punhos Cerrados" e "O Diabo no Corpo", o diretor Marco Bellocchio relembra em Bom Dia, Noite(Buongiorno, Notte, 2003) um fato histórico traumático para os italianos. Numa obra não tendenciosa, mas mesmo assim engajada, o diretor de "O Sorriso de Minha Mãe" - outro filme altamente instigante - aborda o seqüestro e a execução do Primeiro Ministro Aldo Moro pelo grupo Brigadas Vermelhas. 

Em 1978, o então líder do Partido da Democracia Cristã, que havia articulado uma coalizão com os comunistas para governar a Itália, foi seqüestrado pelos ultra-radicais brigadistas vermelhos. Após várias negociações, que incluíam também a troca de presos políticos pela vida de Moro, todas as tentativas acabaram sendo vãs: Moro foi executado, e o ato politicamente suicida acabou tendo por conseqüência o fim do grupo terrorista, o declínio da esquerda e o fortalecimento das forças conservadoras italianas. A noite política, que deságua no cripto fascismo hoje dominante, começava.

Embora fiel aos fatos principais e à sua cronologia, o filme de Bellocchio mostra um ângulo particular do episódio, focado no relacionamento de Moro com sua carcereira, Chiara (Maya Sansa).  Ela foi a única a manter contato externo durante o seqüestro e a votar, na reunião decisiva dos brigadistas, contra o assassinato de Moro.

Num misto de documentário com ficção, o filme reconstitui os 55 dias de duração do episódio, desde o seqüestro até o momento da execução. Imagens de arquivo mostram a negativa do Papa Paulo VI de reconhecer a necessidade de atender às condições impostas para a libertação do prisioneiro (católico praticante), um desfile do Primeiro de Maio em Moscou e outras cenas que servem como pano de fundo para o drama político central.

A locação, quase toda num apartamento alugado pelos seqüestradores e transformado em cativeiro, acentua o tom sombrio do filme, contrastado pela cena magistral da festa do casamento na família de Chiara, com os velhos comunistas Partigiani da resistência anti nazi-fascista cantando canções revolucionárias ao ar livre. Neste momento, Bellocchio demonstra toda sua nostalgia pelos tempos quando a ideologia representava um pensamento libertário e não a força irracional do terror.

Bom Dia, Noite, cujo título vem de versos de Emily Dickinson, é baseado no livro "O Prisioneiro", de Anna Laura Braghetti e a trilha é centrada nas músicas do grupo inglês Pink Floyd, entremeada com faixas de Schubert e outros.

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