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Cópia Fiel (Copie conforme), de Abbas Kiarostami (França/Itália/Bélgica)

Por Gilberto Silva Jr.

Uma forte inquietação cercava a primeira exibição de "Cópia fiel" no Festival de Cannes de 2010: como se portaria numa produção internacional um autor como Abbas Kiarostami, tão ligado às questões inerentes a seu país de origem, o Irã. O conhecimento de sua obra já levaria à conclusão que, como todo grande artista, Kiarostami parte da realidade que o cerca para tratar de questões universais. É pensando nessa universalidade que "Cópia fiel" acaba sendo a prova cabal que seu gênio ultrapassa as fronteiras impostas por nações ou idiomas.

Logo na primeira sequência, Kiarostami demonstra como mesclar de forma contundente as imagens e a palavra, apresentando de forma objetiva personagens, o universo que habitam e a temática central do filme. Enquanto as imagens trazem uma Juliette Binoche confusa e um escritor pragmático representado por William Shimell, é da palestra proferida pelo professor que surgem as inquietações que vão direcionar a narrativa de "Cópia fiel".

É de vital importância a atenção às palavras do escritor, cuja obra tem por subtítulo "Esqueça o original, apenas obtenha uma boa cópia". Falando de seu livro, que atesta a importância da cópia na perpetuação da obra de arte, ele segue dizendo que "as cópias têm sua importância de forma a remeter ao original e, assim, certificar o seu valor". Sua fala também reflete sobre a questão da "originalidade", que remete à palavra "origem". Partindo dessas citações, poderíamos aplicar esse ponto de vista à obra de um autor como Kiarostami, que traz em todos os seus filmes uma série de temas e imagens recorrentes. Seria o autor uma cópia de si mesmo ou um artista que, nessa repetição, perpetua sua originalidade, uma vez que volta sempre aos seus temas/imagens de origem?

Uma das mais fortes imagens de origem na obra de Kiarostami decorre do fato de seus personagens estarem sempre em constante movimento, seja caminhando, como o garoto de "Onde está a casa do meu amigo?", ou num carro, como os protagonistas de "O gosto da cereja" ou "Dez". Não é à toa que Binoche e Shimell seguem viagem, primeiro num carro e depois a pé, vivenciando situações que refletem os dilemas que Kiarostami pretende abordar. Sua jornada em "Cópia fiel" traz à tona toda a genialidade com que o cineasta consegue sempre transcender o ponto de partida do filme até a abrangência máxima do tema. É assim que por meio de encontros sucessivos com casais das mais diversas idades, e passando gradativamente eles mesmos a incorporar um casal, vemos a apresentação da cópia como uma questão inerente à natureza humana, determinada pelo fato de todas as relações interpessoais se reduzirem a uma eterna repetição de si mesmas.

Copie conforme - França/Itália/Bélgica, 2010 - Direção: Abbas Kiarostami - Roteiro: Abbas Kiarostami - Produção: Angelo Barbagallo, Charles Gillibert, Marin Karmitz, Nathanaël Karmitz, Abbas Kiarostami - Fotografia: Luca Bigazzi - Montagem: Bahman Kiarostami - Elenco: Juliette Binoche, William Shimell - Duração: 106 minutos

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