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O polêmico jeito Bertolucci de fazer cinema

Por Graça Paes

Ele pode ser amado ou odiado, mas Bertolucci deixou marcada na história do cinema sua maneira de abordar temas polêmicos, entre eles, os ligados ao sexo, à política e às questões existenciais. Ele tinha a coragem necessária para expressar seus desejos e sua forma de ver o mundo em seus filmes. Lutava contra o que chamava da pressão da indústria cinematográfica dos EUA, mas trabalhou com grandes nomes de Hollywood.

 

Além de diretor, foi poeta, produtor e roteirista e foi considerado o último grande mestre do cinema italiano, tendo mantido sucesso com a crítica cinematográfica durante boa parte de sua carreira. Bertolucci também foi um dos poucos diretores italianos que rodaram filmes em diversos países. Entre eles, "Os sonhadores", filmado em Paris, "O pequeno Buda", no Butão, e "O último imperador", na China. A paixão pelo cinema veio por meio do filme "La dolce vita", de Federico Fellini, e foi incentivada pelo pai, o poeta Attilio Bertolucci, de quem ganhou sua primeira câmera 16mm, aos 15 anos. Aos 19, em 1961, ele iniciou a carreira como assistente de direção de Pier Paolo Pasolini, no filme "Accatone". No ano seguinte, Bertolucci já lançava seu primeiro longa, "La cosecha estéril", escrito e dirigido por ele.

 

As obras de Bertolucci têm seu DNA. E um de seus clássicos foi inspirado em suas fantasias e sonhos eróticos, justamente o longa que foi o responsável por uma das maiores polêmicas do mundo cinematográfico, "O último tango em Paris", de 1972, que tem Marlon Brando no papel principal. É o personagem de Brando que, numa cena de sexo anal, utiliza manteiga como lubrificante. Na época, sua parceira de cena, a atriz María Schneider, tinha apenas 19 anos. Segundo especulações, a atriz não teria sido avisada de que a cena seria realizada desta forma. E, anos depois, ela relatou ter se sentido humilhada e violentada. Em contrapartida, Bertolucci disse que apenas não alertou sobre o fato de ter a manteiga como lubrificante, porque queria realmente uma reação natural dela, mas afirmou que a atriz sabia da violência na cena. Fato é que a sequência é uma das mais famosas da história do cinema e foi a responsável por intensificar a censura do longa ao redor do mundo. Até na Itália ele foi censurado, e Bertolucci, processado por obscenidade. No Brasil, por conta do regime militar, o filme só foi liberado em 1979.

 

Sem saber que seria seu último filme, Bertolucci dirigiu "Eu e você", que chegou aos cinemas em 2012 e aborda uma crise existencial. Na história, o garoto Lorenzo finge para a mãe, com quem mora, que vai passar as férias com os colegas numa estação de esqui e se esconde no porão de casa. Mas sua despedida foi uma participação em “Future reloaded”, lançado em 2013, nos 70 anos do Festival de Veneza. Setenta diretores participaram do projeto, e Bertolucci filmou seu dia a dia de cadeirante nas ruas irregulares do Trastevere, em Roma. A cadeira de rodas surgiu em sua vida após uma cirurgia de hérnia de disco.

 

Em 2018, aos 77 anos, Bertolucci foi questionado sobre como gostaria de ser lembrado, e ele respondeu “Não me importa”. Mas pode perfeitamente ser lembrado por suas obras cinematográficas, longas, curtas e documentários, que falam por ele, e também por seus prêmios, como a Palma de Ouro honorária no Festival de Cannes em 2011, o Leão de Ouro no Festival de Veneza em 2007, pelos Oscars de melhor roteiro adaptado em 1972, melhor diretor em 1974, melhor diretor e roteiro adaptado em 1988 e pelo Globo de Ouro de melhor roteiro adaptado em 1988.

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