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Dublagem ou legendagem? Eis a questão da Classe C

Por Roni Filgueiras

No Brasil, a dublagem completa 75 anos em 2013. O marco foi o início das atividades dos estúdios da CineLab, no Rio de Janeiro. Já o ano de 2014, segundo o economista Marcelo Neri, à frente do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas, marcará os dez anos da ascensão da nova classe média popular brasileira (MPB). O que, por tabela, impactou todos os setores da economia com respingos indeléveis na indústria cultural e do entretenimento. 

Essa mesma indústria vem sendo chacoalhada ainda por mudanças tecnológicas, sobretudo a internet, que alteraram radicalmente nossa percepção do tempo. O que, segundo o escritor e jornalista Nicholas Carr, autor de "A Geração Superficial: O Que a Internet Está Fazendo Com os Nossos Cérebros", nos torna menos capazes de concentração e reflexão. 

Mas o que afinal a classe C tem a ver com os 75 anos dos estúdios CineLab e a tecnologia? Como disse o velho comunista, tudo. Os elementos que inauguraram um singular modo de assimilar a imagem em (vertiginoso) movimento se associam à recente proliferação das cópias dubladas em um cinema perto de você, atestam especialistas do mercado. O empoderamento dessa camada social, afeita à dublagem da TV aberta, e as recentes tecnologias estão redesenhando o mapa-múndi do audiovisual. TV, internet e cinema se adaptam ao gosto de consumidores cevados à velocidade máxima (ou seria o contrário?). A edição digital frenética também não permite a proeza da leitura instantânea.

Daí surge a polêmica recente: serão os filmes dublados astronautas que dominarão o circuito? De um lado do ringue, há quem erga os punhos pela maior oferta de obras estrangeiras em idioma local - em prol mesmo da sobrevivência das salas de exibição em vias de se tornarem shopping centers. Um circuito exibidor rico permite as condições de surgimento de uma real indústria cinematográfica nacional, argumentam. Do outro lado da arena, os adversários (críticos de cinema e cinéfilos) defendem que o som original é parte indissociável da obra cinematográfica.

Tradicionalmente uma quase exclusividade de produções endereçadas ao espectador infantojuvenil, a "opção" de ouvir diálogos em português passou a ser mais frequente nas salas multiplex. Um hábito moldado à força de lei em alguns países, como na Espanha, a dublagem no cinema é influenciada pela força centrípeta da cadeia que envolve na ponta a TV. Produções estrangeiras fecham contratos de exibição na TV aberta mesmo antes de entrar em cartaz. Como se trata de um processo caro, o cliente TV determina onde e como será feita a versão falada em português. A tecnologia digital permite, então, ao exibidor oferecer a dublagem no cinema facilmente, num simples apertar de botão.

Segundo o empresário Paulo Sérgio Almeida, do site Filme B, dedicado à análise do mercado cinematográfico brasileiro, a oferta se adequa à demanda. E as legendas sobreviverão, em menor número de cópias, adaptando-se ao gosto do freguês e à obra mais autoral. Na cadeia produtiva da indústria do cinema, a demanda é ditada agora pelo extrato social saudado como a bússola que norteia a economia nacional.   

No país da emergente classe MPB, ainda há muito a avançar nos quesitos emprego e educação formal e taxa de natalidade, como disse o economista Marcelo Neri, apesar das incontestáveis melhorias nesses índices. Resta saber se em anos futuros, e com mais educação, os espectadores recém-chegados ao balcão do audiovisual vão pedir por altas doses de legendas ou se até lá a dublagem terá virado tradição.

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