top of page

Homenagem a Marília Pêra

Por Zeca Seabra

Considerada uma mestra e uma grande profissional pelos seus colegas, Marília Pêra tinha um talento extraordinário e fazia tudo na carreira com muito amor. Era uma das atrizes mais completas do Brasil e, além de atuar, era bailarina, cantora, coreógrafa, diretora e produtora de espetáculos musicais. Marília trabalhou em mais de 50 peças, quase 30 filmes e cerca de 40 novelas, minisséries e programas de televisão.

 

Nascida no Rio de Janeiro, no Rio Comprido, em 22 de janeiro de 1943, Marília Pêra, filha e neta de atores, subiu num palco pela primeira vez quando tinha 19 dias de vida, no colo de uma atriz, amiga de sua mãe, numa peça em que precisavam de um bebê. Sua estreia no teatro profissional se deu com apenas quatro anos, interpretando uma das filhas de Medeia, num espetáculo da companhia Os Atores Unidos. A disciplina sempre esteve presente na vida e no trabalho da atriz. Foi pelas mãos de seu pai, o ator Manoel Pêra, que Marília estudou rigorosamente piano por 10 anos (chegando a 8 horas por dia com a professora Elza Usurpator) e balé clássico com a professora Lydia Costallat.

 

Dos 14 aos 21 anos, atuou como bailarina e participou de musicais e revistas, como o espetáculo “Minha querida dama” (1962), protagonizado por Bibi Ferreira. Aos 20 anos, no teatro de revista, a atriz excursionou pelo México com a companhia Carlos Machado. Em 1964, ela derrotou a novata Elis Regina em um teste para o musical “Como vencer na vida sem fazer força”. Em 1968, no auge da ditadura militar, militantes do Comando de Caça aos Comunistas agrediram o elenco de “Roda Viva”, e Marília, que não tinha nenhum engajamento político, foi espancada.  

 

Sua estreia na televisão aconteceu na novela “Rosinha do sobrado”, na Rede Globo de Televisão, em 1965. De 1965 a 1968, trabalhou em diversas peças e participou da novela “Beto Rockfeller”, na TV Tupi, considerada um marco na teledramaturgia, mas o reconhecimento popular só aconteceu em 1971, com a Shirley Sexy de “O cafona”. Daí em diante, Marília fez personagens memoráveis como a taxista Noeli de “Bandeira 2“, de 1971, a Serafina de “Uma rosa com amor”, de 1972 , a empregada Manoela de “Super Manuela”, de 1974, e a milionária falida Rafaela de “Brega e chique”, de 1987. Em “Primo Basílio”, de 1998, Marília mostrou seu lado dramático de forma soberba ao interpretar a amarga governanta Juliana. Marília Pêra transitava com facilidade por todos os gêneros e fazia tudo com muita propriedade. Ela considerava o teatro como sua segunda casa e aprendeu o ofício nas coxias, assistindo a grandes a mestres como Dulcina de Moraes e Henriete Morineau.

 

Uma das atrizes que mais atuaram sozinha nos palcos, Marília ganhou duas vezes o Prêmio Molière (por “Apareceu a Margarida”, em 1974, e “Brincando em cima daquilo”, em 1984) e interpretou mulheres marcantes como Dalva de Oliveira, em “A estrela Dalva”, em 1987; a diva Maria Callas, na peça “Master class”, em 1996; e a estilista Coco Chanel, na peça “Mademoiselle Chanel”, em 2004; além da ex-primeira dama do Brasil Sarah Kubitschek, na minissérie “JK”, em 2006, de Maria Adelaide Amaral. A estreia como diretora aconteceu em 1978 na peça “A menina e o vento”, de Maria Clara Machado, e, na função, Marília foi responsável por um dos maiores sucessos teatrais do país, “Irma Vap”, com Marco Nanini e Ney Latorraca, que ficou em cartaz por onze anos.

 

Ao longo de quase 60 anos de uma carreira muito bem vivida (praticamente toda a sua vida), Marília Pêra se destacou também no cinema em filmes como “Pixote, a lei do mais fraco” (1981), de Hector Babenco – pelo qual recebeu o prêmio de melhor atriz do ano da Associação Nacional de Críticos dos Estados Unidos e também da Associação de Críticos de Nova York e Los Angeles –, “Bar Esperança” (1983), “Tieta do Agreste” (1996), “Central do Brasil” (1998) – quando teve a oportunidade de atuar ao lado de Fernanda Montenegro –, “O viajante” (1999) e a comédia “Embarque imediato” (2009), de Allan Fiterman, último longa de Marília lançado comercialmente antes de sua morte. No filme, ela interpreta Justina, uma supervisora do aeroporto do Rio de Janeiro frustrada por não fazer sucesso na vida, o que, com dotes histriônicos de cantora e dançarina e ainda por cima com Marília contracenando com Sandra Pêra, sua irmã, oferece as melhores tiradas do filme.

 

Homenageada pela escola de samba paulista Mocidade Alegre em 2015, Marília estava envolvida com a gravação de um disco para a produtora Biscoito Fino, cujo repertório incluía canções de Johnny Alf, Tom Jobim e Dolores Duran. De espírito incansável e com uma natureza trabalhadora, Marília poderá ser vista em 2016 em alguns projetos, como a série de TV “Pé na cova”, que entrará na quinta temporada, e no filme “To ryca”, com Samantha Schmütz.

 

No dia 5 de dezembro de 2015, a grande atriz Marília Pêra saiu de cena, deixando um enorme legado não só para a classe artística, mas para o teatro brasileiro. O público, que adorava sua carismática presença, ficou órfão de seu talento indomável e entristecido pela partida desta mulher que fez tantos e tão espetaculares personagens, restando, como gesto de amor, respeito e admiração, a eterna saudade.

 

Filmografia (longas-metragens)

1968 - O homem que comprou o mundo

1970 - É Simonal

1974 - O donzelo

1975 - Ana, a libertina

1975 – O rei da noite

1978 - O grande desbum...

1981 - Pixote, a lei do mais fraco

1983 - Bar Esperança

1984 - Mixed Blood

1987 - Anjos da noite

1990 - Dias melhores virão

1995 - Jenipapo

1996 - Tieta do Agreste

1998 - Central do Brasil

1999 - O Viajante

2001 - Amélia

2002 - Seja o que Deus quiser!

2003 – Garrincha, a Estrela Solitária

2006 - Acredite, um espírito baixou em Mim

2006 - Living the dream

2006 - Vestido de noiva

2006 – O Fim e o Princípio

2007 – Pixote in Memoriam

2007 – Jogo de Cena

2008 - Polaróides Urbanas

2008 - Nossa vida não cabe num opala

2009 – Dzi Croquettes

2009 - Embarque Imediato

2016 - Dona do paraíso

2016 - Tô Ryca

bottom of page