Homenagem à atriz Léa Garcia
Por Bruno Giacobbo
A vida como ela é... o talentoso destino de Léa Garcia
Não temos como saber quando nem como iremos morrer, a única coisa que sabemos é que um dia morreremos. Assim, o destino às vezes nos reserva surpresas. A morte de um soldado na guerra é algo esperado. Já a de um ator no palco, não. A atriz Léa Garcia, uma das pioneiras entre os negros na dramaturgia nacional, não morreu em um palco propriamente dito, mas quis o destino que ela viesse a falecer, em 15 de agosto de 2023, perto de outro tipo de palco, o palco do mais tradicional festival de cinema do Brasil: o de Gramado. Léa estava na cidade para receber, no dia seguinte, um prêmio pelo conjunto de sua obra, o Troféu Oscarito. Mas quis o destino, sempre ele, que este fosse um prêmio póstumo.
Nascida Léa Lucas Garcia de Aguiar em 11 de março de 1933, no Rio de Janeiro, a atriz sabia desde cedo que a arte era a sua vocação. Inicialmente escolheu a literatura. Queria ser escritora. Tudo mudou quando conheceu o dramaturgo Abdias Nascimento, com quem se casaria e teria dois filhos. Foi ele quem lhe apresentou as tragédias gregas e, com estas, o amor pelo palco. E foi ele ainda que lhe deu uma de suas primeiras oportunidades de atuar, em uma peça, de sua autoria, chamada “Rapsódia negra”, em 1952. Dos palcos para os estúdios, passando pelos sets, todo o resto foi fruto do seu enorme talento.
Em um rápido levantamento, Léa Garcia atuou em mais de 150 produções, incluindo teatro, cinema e TV. Seu último trabalho foi “Independências” (2022), série da TV Cultura. Mas o seu ápice, mesmo considerando os vários prêmios recebidos ao longo de uma carreira de mais de 70 anos, entre eles o Kikito de Melhor Atriz Coadjuvante por “As filhas do vento” (2005), foi em “Orfeu Negro” (1959), de Marcel Camus. Pela película, ganhadora do Oscar de Melhor Filme em Língua Estrangeira em 1960, e da Palma de Ouro, ela concorreu ao prêmio de Melhor Atriz em Cannes. Assim, Léa se tornou, definitivamente, uma referência para todos os intérpretes pretos do Brasil. Talvez, lá atrás, ela apenas sonhasse fazer arte. Mas como saber o que o destino nos reserva, não é?
As filhas do vento, de Joel Zito Araújo (Brasil, 2004). Com Ruth de Souza, Léa Garcia, Milton Gonçalves.
Drama. Sinopse: Em uma pequena cidade de Minas Gerais, duas irmãs se reencontram depois de anos de afastamento. Uma delas foi para a cidade, em busca de uma carreira de atriz. A outra ficou para cuidar do pai. 85 minutos. 14 anos.