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Kick- Ass -Quebrando Tudo (Kick-Ass), de Matthew Vaughn (EUA)

Por Rodrigo Fonseca

"Morrer é o plano de carreira de todo super-herói", vaticinou o quadrinista Matt Fraction no gibi Stark: A queda, em meio a uma confissão niilista do Homem de Ferro. Se conhecesse de perto Kick-Ass, o estudante metido a vigilante criado por Mark Millar e John Romita Jr., Fraction teria um exemplo perfeito para embasar seu argumento acerca do fado dos mascarados. Afinal, em sua rotina noturna de enfrentamento a homens maus, o garotão David Lizewski mantém uma dieta de atividades insalubres para impressionar a colega de escola Katie, brincando de guardião da pólis. Talvez por perceber o risco por trás das ambições altruístas (e sexuais) do jovem, o cinema tenha sido implacável com seu gesto, num nível de escárnio incompatível com o texto perplexo dos balõenzinhos escritos por Millar e desenhados por Romita Jr. Na telona, o inglês Matthew De Vere "Vaughn" Drummond, realizador do morno Stardust - O mistério da estrela, quis achar uma veia cômica capaz de enquadrar Kick-Ass como um reflexo da histeria pop nossa de cada dia. Interessa ao diretor dissecar a "síndrome de Super-Homem" do menino que, num surto de Clark Kent, disponibiliza-se de uma hora para a outra, a distribuir piparotes nas fuças alheias acreditando ser tão apto a defender os fracos e os oprimidos quanto qualquer filho de Kripton da ficção. Falando dela, Vaughn usa a cartilha do chamado "cine-HQ" para compor uma alegoria psicanalítica sobre sublimações. Violentas sublimações, diga-se de passagem.

Numa felicíssima escolha de elenco, Vaughn contou com a expressão (proposital) de sonso de  Aaron Johnson para construir Lizewski como um típico menino nerd. Perdas familiares e o amor mudo por Katie (a teteia Lyndsy Fonseca) o convidam a um mundo imaginário onde ele se sente um Guilherme Tell teen, frente a um mundo chefiado pelo chefão mafioso Frank DAmico (Mark Strong, um artífice do cinismo). Mas reinações imaginárias não satisfazes Lizewski em suas entradas e bandeiras inconscientes pelas selvas eróticas de Katie. Para ele, sujar as mãos na vilania alheia é o único veio de achar a autoestima perdida de todo CDF solitária, cortando o cordão umbilical com a mãe-timidez. O problema é que, feito anjo caído, o ato de decepar as asas (da inocência) custar-lhe-á dentes, ossos e afins. Mas há compensações: a platina e os demais metais acoplados a seu esqueleto fazem dele um semiciborgue, com futuro de dragão à vista. 

Na forja férrea de um espancamento, Lizewski passa por um rito de passagem e vira o Kick-Ass do título de um filme que celebra a anarquia. Sem as castrações da correção política, Vaughn faz uma crônica abusada da adolescência pós-moderna pelo viés de um delírio fantasiado de justiça. Ao topar uma odisséia homérica pelo heroísmo, Kick-Ass percebe que o papinho de "grandes poderes trazem grandes responsabilidades" dito por um certo Peter Parker empurra seus passos contra DAmico. Em seu caminho, passam um pai e sua filha psicótica: o ex-tira metido a Batman Macready (um inspirado Nicolas Cage) e  Mindy, a Hit-Girl (Chloe Moretz). Juntos, eles ajudam Kick-Ass e a platéia a derrotarem o preconceito contra os saberes que vêm do fast-food cultural e nossa hipocrisia em relação ao sacrifício como ato de amor ao próximo.

Kick-Ass - EUA, 2010 - Direção: Matthew Vaughn - Roteiro: Jane Goldman e Matthew Vaughn - Produção: Adam Bohling, Tarquin Pack, Brad Pitt, David Reid, Kris Thykier - Fotografia: Ben Davis - Montagem: Eddie Hamilton, Jon Harris e Pietro Scalia - Música: Marius De Vires, Ilan Eshkeri e John Murphy - Elenco: Aaron Johnson, Nicolas Cage, Christopher Mintz-Plasse, Chloe Moretz - Duração: 118 minutos

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