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O Escafandro e a Borboleta (Le Scaphandre et le Papillon), de Julian Schnabel (França/EUA)

Por Carlos Alberto Mattos

Um olho - mesmo o esquerdo - pode operar maravilhas. Foi só isso o que restou de movimentos a Jean-Dominique Bauby depois que ele sofreu um derrame, em 1995. Além, é claro, dos "movimentos" mentais da memória e da imaginação. 

Quando o filme começa, Bauby está voltando a si de um coma de 20 dias. O espectador é também confinado ao ponto de vista do personagem, do leito do hospital, por mais ou menos 20 minutos. É um ato de coragem do diretor Julian Schnabel e do roteirista Ronald Harwood - e também uma senha do que virá. 

A contribuição que Schnabel faz à expressão da subjetividade no cinema não é pequena. São raras as cenas que assumem um ponto de vista objetivo sobre o personagem, sendo que muitas dessas referem-se a suas projeções mentais nos vôos de lembrança e fantasia. A câmera é quase sempre seu olho, na percepção embaçada, confusa e limitada do paciente. É quando o filme explora magistralmente o drama cotidiano e miúdo do enclausurado.

No fluxo dos pensamentos o ex-editor destila sua iconoclastia, sua ironia para com as mentiras piedosas que cercam os enfermos graves, sua falta de auto-piedade, sua consciência de que a vida está por um fio e que nenhum milagre vai mantê-lo esticado por muito tempo. Bauby não é um herói da "superação" nem da "esperança". O que torna o personagem admirável é sua normalidade diante das culpas, do medo e da vergonha. Ele não é transformado nem transforma ninguém. O Escafandro e a Borboleta não é um conto moral, mas um conto real.

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