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Retratos Fantasmas

Por Tatiana Trindade

A alma exposta

 

 

Quando um diretor de cinema decide contar a sua vida, normalmente o faz de maneira ficcional, como um tributo àquela arte que é parte central de sua jornada. A afetividade em contar essas histórias é, portanto, quase palpável por parte do espectador. Citando exemplos recentes, Alfonso Cuarón trouxe esse olhar com “Roma”, em 2018, e em 2022 Steven Spielberg fez o mesmo com “Os Fabelmans”.

 

Já Kleber Mendonça Filho transforma suas memórias em um documentário recheado não só com sua infância e seu desenvolvimento, mas também com a crescente precariedade da indústria cinematográfica em Recife no mesmo período. Segundo Kleber, é como se um não existisse sem o outro, e as marcas deixadas pelo abandono da cultura na cidade, ainda perpetuam seus rastros no diretor. Marcas com as quais o amante do cinema brasileiro se identifica, porque o declínio da cultura aconteceu em nível nacional.

 

Passando pela casa que deu lugar a tantas lembranças contadas por ele e pelos principais cinemas da cidade, que desapareceram ao longo dos anos, Kleber revisita memórias familiares e de pessoas importantes que tiveram papel fundamental em sua vida. Ele opta por mostrar a realidade, mas vai além de uma visão crua. O mundo que vemos é o seu mundo, com seus olhos e lentes de adulto e de criança. A casa e os cinemas são personagens centrais, e o conjunto das filmagens e a narração expõem sua alma na tela, que é exatamente o ingrediente-chave para ser uma de suas obras-primas.

 

“Retratos fantasmas” pode não atrair de imediato o espectador pelo estigma que a arte documental possui – a receptividade aos longas ficcionais costuma ser muito maior. Contudo, “Retratos fantasmas” está em um lugar tão intrínseco de fantasia, sonho, amor e realidade que é fácil esquecer que se trata de documentário. Esta é a característica que o torna único – por ter sido realizado somente pela pessoa que poderia contar essa história de forma tão especial.

Retratos fantasmas, de Kleber Mendonça Filho (Brasil, 2023).

Documentário. Sinopse: A história se passa no Centro de Recife, em Pernambuco, simultaneamente entre o passado e agora, entre o Cinema Veneza, em duas pontes, e o Cinema São Luiz. 93 minutos. 12 anos.

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