O título original de "Um Alguém Apaixonado" é o mesmo de uma antiga canção americana, "Like someone in love" - que define bem o que se vê na tela: mais de um personagem se comportam como se estivessem apaixonados. Há quem finja que é aquilo que parece ser - mas não é, e talvez gostasse de ser o que apenas parece. Talvez haja quem fique de fato apaixonado pelo jogo de cena que representa. O exemplo da prostituição é emblemático e pertinente, pois uma garota de programa pode fingir que gosta do encontro sexual que vende; e seu cliente gosta de viver uma fantasia - a ilusão de que aquilo não é tão somente sexo pago. Mas o filme do iraniano Abbas Kiarostami, rodado no Japão, vai além do óbvio ao qual se resume tal encontro no qual o que se vende e se compra é ilusão, mais do que sexo nu e cru. O cineasta desenvolve o tema já presente em sua realização anterior, "Cópia Fiel": o deslizamento das identidades no campo dos diferentes relacionamentos com os outros - pois não somos sempre os mesmos nas diversas relações que estabelecemos. E podemos representar vários modos de ser. E propiciar equívocos.

A cena de abertura antecipa o que vem a seguir: uma jovem ao telefone num bar procura driblar os questionamentos de quem parece ser seu parceiro amoroso. Uma outra moça finge ser quem não é para quem está do outro lado da linha, pretendendo confirmar as mentiras da jovem que fala com seu provável namorado. Ela diz que está num bar, mas está em outro - e quase que ao mesmo tempo tenta não atender às solicitações de um homem que quer lhe falar de "negócios". Estão definidas algumas possibilidades de equívocos entre o que se diz, o que se faz - e, ainda, o que se quer fazer ou deixar de fazer.

Alguns desses enganos são estimulados intencionalmente por mentiras e omissões, mas o enredo vai trazer outros modos de deslizamentos equívocos entre a jovem e um homem de mais idade. Este velho parece querer criar um cenário galante com música suave e mesa posta com velas para um faz de conta de encontro amoroso não profissional. Mais adiante, um inusitado triângulo vai se fechar (ou se abrir) com a entrada em cena do namorado da moça, com quem ela falava ao telefone no início do filme: o rapaz só consegue supor que aquele senhor idoso seja avô de sua namorada... 

Por meio de elipses e da estrutura aberta do roteiro, o que se demonstra são os equívocos das relações em geral: seja porque mentimos para os outros, seja porque preferimos incorrer em fantasias de autoengano, ou ainda porque podemos partir de premissas que tomamos como certezas... imaginárias. O que importa para Kiarostami é definir as indefinições do que se passa entre os personagens - e entre todos nós.

Like Someone in Love - Japão/ França, 2012 - Direção: Abbas Kiarostami - Roteiro: Abbas Kiarostami - Produção: Nathanaël Karmitz, Abbas Kiarostami, Charles Gillibert - Fotografia: Katsumi Yanagijima - Montagem: Shogo Yokoyama - Elenco: Ryo Kase, Denden, Rin Takanashi, Tadashi Okuno, Denden, Ryota Nakanishi - Duração: 129 minutos.